Lunda Tchokwe

Os Tchokwe / Chokwe desfrutam de uma admirável tradição de esculpir máscaras, esculturas e outras figuras. A sua arte inventiva e dinâmica, é representativa das várias facetas inerentes a sua vida comunitária, dos seus contos míticos e dos seus preceitos filosóficos. As suas peças de arte gozam de um papel predominante em rituais culturais, representando a vida e a morte, a passagem para a fase adulta, a celebração de uma colheita nova ou ainda o início da estação de caça. O nome Tshokwe apresenta algumas variantes (Tchokwe, Chokwe, Batshioko, Cokwe) e, entre os portugueses, ficaram conhecidos por Quiocos . "Nesta pagina podemos usar qualquer variante do nome Tshokwe (acima referido)"

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sexta-feira, 18 de outubro de 2013

Casamento na cultura tradicional tchokwé

Imagem in: africafederatin.com
A honra, a dignidade e o relacionamento entre as famílias facilitava a aproximação de pais ou tutores do pretendente à família da jovem amada, longe das brincadeiras de infância, terminadas de forma precoce, por altura da passagem pela circuncisão e transcorrido o primeiro ciclo menstrual. 
 O sucesso do diálogo visava a efectivação do noivado, uma espécie de namoro com compromisso de casamento, que obrigava à parte solicitante a entrega de um tributo, o alembamento, traduzido num prato e uma enxada. Marcada a data para o casamento, as duas famílias barravam as caras dos noivos com terra vermelha, húmida, em rituais separados, para proteger o casal de forças maléficas, selando a cerimónia do noivado.
  Levada às costas por uma tia, para a casa do noivo, com a parte superior do corpo coberta por missangas e um pano na parte inferior, a noiva, com um rabo de boi numa das mãos, caminha protegida por um guarda-sol, rodeada por membros da sua família, levando uma enxada e um prato. Um palhaço encabeçava a marcha, alternando a corrida com danças e gestos que atraíam a atenção dos transeuntes, além de anunciar a chegada da nubente e familiares à casa do noivo. 
 A recepção da delegação decorria num ambiente de festa, cuja duração dependia das possibilidades económicas dos organizadores. O cenário é dominado por música e dança, com garantia de alimentos e bebidas. A festa culmina na casa dos recém casados. Os familiares da jovem casada prepararam um enxoval representado por louça, recipientes para água e alimentos para suportar os primeiros sete dias do casal. 
 No fim dos sete dias é autorizado o regresso provisório da esposa à casa paterna antes de assumir as lides domésticas, efectivado o regresso definitivo à sua nova casa.  

Expectativas de procriação

Durante dois anos as famílias aguardam por uma gravidez da jovem casada. A ausência de qualquer indício obriga à procura de um curandeiro para analisar a situação e submeter a parte afectada (marido ou mulher) a tratamento. Um toque manual à boca do útero para detectar anomalias do seu posicionamento marca o inicio de uma observação minuciosa do quimbanda à jovem, antes do tratamento efectivo, durante quatro dias, via de regra, à base de infusão de folhas de plantas medicinais. 
 No caso de suspeita de anomalia no homem, o esperma resultante de uma masturbação forçada é colocado num pano preto, fazendo a vez de uma lâmina de laboratório. É então feito o teste de vitalidade, por pessoas de reconhecida experiência, por sucessos em vários tratamentos feitos a pessoas com problemas do género. O temor pelo provável insucesso no tratamento à jovem esposa, preocupa o seu irmão mais velho, porque pode ditar que seja devolvida aos pais, por familiares do marido, comprovada a sua esterilidade irreversível. 
 De acordo com o historiador Américo Samutunga, a opção pela poligamia minimizava a situação. Nestas circunstâncias “o número de esposas assumidas dependia das possibilidades do marido que tinha a obrigação de efectivar a igualdade de tratamento entre ambas”. 
 O feitiço que cada uma possuía, longe de constituir ameaças a inocentes, visava a protecção dos lares. Américo Samutunga referiu que a esterilidade masculina tinha atenuantes. “A continuidade do casamento dependia da vontade e consideração da família da esposa, expectante num milagre” para inverter o quadro. 
 Tais princípios, segundo o historiador, modelaram a forma de ser e estar das comunidades. As influências extra-regionais a partir de 1975, alteraram hábitos e costumes vigentes nos distintos domínios da vida social dos Lunda Tchokwé. 
 O rei Mwene Mwatxissengue Watembo, casado há mais de 50 anos no sistema tradicional, condena a perda de originalidade em várias famílias lundas, reféns da ganância em detrimento da honra e dignidade, convertendo os pedidos de casamento feitos às filhas como oportunidade para enriquecimento. 
  “A perda destes e outros valores da cultura na região, acentuou a ocorrência de mortes jamais notificadas no passado”, sublinhou, convicto o rei Mwene Mwatxissengue Watembo. 
 O soberano nota que após o casamento, os nubentes tinham quatro dias para a lua-de-mel. Uma bacia de fuba, galinha trazida pela família da noiva, para provar os seus dotes na cozinha, e autorizar da posse da casa, marcavam a última confraternização na etapa depois do casamento.

In: Jornal de Angola