Num banco de madeira tradicional, uma senhora pintava uma tela em tons laranja. Nessa tela via-se um leão morto sob a lança de um homem alto e esguio; o caçador mantinha orgulhosamente o pé sobre a cabeça do leão e olhava para a sua amada, cuja felicidade era evidente. As árvores da savana pareciam ser tremendamente pequenas perante aquele arte de bravura. Ao olhara com maior atenção constatou semelhanças com os mesmos personagens do quadro dos amantes, à margem do rio. Riu-se da metáfora do Leão. Parecia-lhe que o homem que viria a ser o seu amado, esmagaria o Leão para liberta-la daquela prisão.
- Boa tarde minha senhora amei esse quadro.
- Imagino que sim. É o Leão que a cativa, não é? – disse a velhota com uma voz arrastada fitando-a nos olhos. Lueji, por sua vez não podia acreditar.
- É … mesmo … o Leão – gaguejou enquanto descortinar como a senhora decifrava-lhe a mente
- O Leão é uma força muito poderosa na Natureza que deve ser respeitado; mas nunca venerada, minha querida. Quando veneras o poder do Leão tornas-te sua presa e ele vai usar-te sempre. Por isso, quando somos dominados por uma Leão, só temos uma hipótese: Abatê-lo, para seguir em frente.
- Podemos evita-lo – sugeriu à procura de uma solução menos drástica.
- Fugir? Isso não é soluça. O Leão fareja a quilometro, minha querida. Uma vez presa,para sempre presa.
Ele ainda de avião – disse a rir, lembrando-se que Leão Magno estava noutro continente.
O Wayami encolhia os ombros e ria-se daquela conversa absurda sobre um leão. Acabou por se afastar, para ir cumprimentar os senhores que estavam sentados à sombra de um cajueiro.
- Querida, estava à tua espera –disse Utima libertando um suspiro de alivio.
- À mina espera, como assim? – desconfiou tentando encontrar alguma lógica naquelas palavras.
- Utima levantou-se lentamente, apresentando um corpo frágil e débil. Entrou para a cubata em adobe e palha. Convidou-a a entrar para um espaço onde o cheiro do barro misturava-se com o das tintas.
- Bem-vinda à minha humilde casa, minha filha. A cubata era pequena, mas muito arrumada e apresentava quadros ordeiramente pendurados em algumas paredes.
- Eu sei que estou a morrer, filha. Urge passa conhecimento a quem possa garantir a sua perpetuação.
- A morrer? – disse Lueji, aflita. Não diga isso…
- Sim filha. Todos temos a nossa hora. Ainda, o ano passado foi o teu avo, não foi?
- Foi, sim – confirmou tristemente e envergonhada por n’ao ter estado no óbito.
- Esperamos por ti ma não vieste…
- Não pude mesmo – explicou recordando-se não possuir realmente nenhuma justificação plausível a não ser motivos profissionais.
- Eu sei afirmou pesarosamente – e porque vieste agora?
- Uma longa historia que está relacionada com os seus quadros.
- Com os meus quadros? – questionou Utima surpreendida.
- Sim! Os que desapareceram…
- Ai é? Zambi sabe maemo o que faz minha filha. Foi a forma que Ele encontrou para nos juntar. Mas como chegaste ate mim? Como soubeste das obras?
- Uma historia complicada – recordou Lueji – no entanto de forma resumida posso dizer que encontrei um rapaz que estava na posse de um conjunto de informação. Nessa informação estavam as fotos dos seus quadros.
- Deve ter sido o pobre do Kieza. Faleceu recentemente, não é? – disse enquanto enchia o copo de maruvu. Bebeu um trago e sentou-se calmamente num banquinho de madeira onde estavam esculpidos alguns motivos florestais. Fitou Lueji com um ar calmo e comprometido;- dói demais quando perdemos jovens desta forma-desabafou enquanto puxava outro banco para Lueji.senta-te filha! Temos muito por conversar- disse deixando as lágrimas jorrarem pelo seu rosto. Estamos a perder-nos! – desabafou deixando escapar a desolação que lhe assolava a alma.
- Acho que não pode tirar coclusoes precipitadas, niguem percebeu bem ainda p que se passou.
- O que se passa é bem simples, nós temos a chave para chegar à Aldeia de Deus. E eles querem que essa chave se perca.
- Mas se eles já a têm; pelo que percebi os quadros são a chave da sabedoria.
- São, mas apenas os enviados conseguem atingir essa sabedoria. Conseguem percorrer o caminho da luz. É preciso ter a simplicidade de uma criança e um amor incondicional para se perceber as pistas.
- Mas a Utima concerteza já atingio essa sabedoria.
- Nunca consegui chegar a Aldeia de Deus. O teu avo dizia que eu não a queria ver.
Será? A sua sensibilidade artística é tão grande que custa a acreditar que não a quisesses ver…
- Não sei! Mas a verdade é que eu gosto é d pintar. Essa é a minha missão cá. A procura de Aldeia de Deus e da sabedoria que encerra cativa-me mas não ao ponto de abandonar as minhas telas e o meu mundo.
- Percebo-a Utima. Não é fácil deixarmos o nosso mundo para embarcarmos em mundo desconhecidos.
- No entanto filha, há riscos que corremos que na altura desconhecemos o seu verdadeiro sentido? Mas, mais tarde, se tornam compreesiveis.
- Penso que é isso que está acontecer comigo!? Estou a correr risco na vida que não sei se mais tarde não me arrependerei.
- Não te vais arrepender pois estávamos à tua espera. Como tal só podes estar no sitio certo.
IN: Aldeia de Deus/Tchehunda Tcha Nzambi
LUEJI DHARMA